O TEXTO NÃO É MEU, MAS CONTA MINHA TRAJETÓRIA TAMBÉM
Este texto abaixo do Josh Brisby descreve bem minha trajetória também “de Genebra para Wittemberg”, ou seja, o porque deixei de ser calvinista e me tornei luterano. Eu já tentei por diversas vezes contar essa história, sempre sou questionado do porque deixei de ser calvinista e me tornei luterano. Mas as minhas tentativas quase sempre terminam em embates teológicos, os calvinistas a quem me conto minha história não costumam reagir bem ao fato de alguém deixar de ser parte de sua “panelinha”, e eu não gosto de brigar por questões estritamente pessoais que não dizem respeito a mais ninguém, por isso nunca postei nada aqui no Blog explicando os problemas principais do calvinismo para mim, pelo motivo puro e simples de evitar a fadiga mesmo..
PORQUE NÃO FICO COMPARANDO CALVINISMO E LUTERANISMO
Primeiro que ser luterano não me torna melhor que ninguém, então não preciso levantar essa bandeira como os fanáticos políticos e religiosos fazem pela internet com suas bandeiras, batendo com elas na cabeça dos outros e se achando o máximo por serem “Esquerda”, ou “Direita”, ou “Pentecostais”, ou “calvinistas”, ou qualquer outra coisa. Segundo que a justificação é somente pela fé em Jesus, não pela crença no Livro de Concórdia, e a Palavra de Deus é a Bíblia, disponível a todos. Então a igreja de Jesus não é formada apenas por luteranos, mas todos os crentes nele, que Ele escolheu pelo mundo inteiro, de diversas denominações da Cristandade que formam a Igreja Militante de Jesus, da qual a Igreja Luterana é parte. Acredito ser a melhor, a mais correta, claro, senão eu seria outra coisa, assim como você deve considerar a sua denominação e sua vertente teológica a melhor também, ou você seria outra coisa, mas penso assim isso por questões teológicas, não por méritos diante de Deus, porque todas as nossas obras são como o imundo e nossas justiças como trapo de imundície (Is 64.6).
Eu li este texto esses dias e achei bem condizente com a minha experiência, posso enumerar os mesmos pontos que o fizeram se decepcionar com o calvinismo que me decepcionaram também e os mesmos pontos que o atraíram no luteranismo que me atraíram também, então vou traduzir o texto em quase sua totalidade e postar aqui para vocês.
UMA OBSERVAÇÃO, ANTES DE COMEÇAR
Eu modifiquei algumas pequenas coisas, mas minhas modificações foram quase que totalmente aonde o autor original diz que o luteranismo é o “único caminho” e declarações similares. No resto do blog, o autor não assume uma postura exclusivista soteriologicamente, seu exclusivismo se resume aos pontos que exclusivamente se encontram no luteranismo, no que acabo sendo exclusivista também, porque não encontro em outras vertentes alguns benefícios que só encontro no luteranismo, como a justificação apenas pela fé de verdade (ou seja, a justificação é por meio da fé e ponto final, não tem “vírgula”, não tem “mas”, como vejo em outras vertentes), a correta distinção entre Lei e Evangelho, a Liberdade Cristã e outros benefícios que outras vertentes cristãs costumam rejeitar, ou modificar, e eu tenho encontrado no luteranismo. Mas, como estou tirando um texto do contexto de seu blog, preferi fazer esta modificação para que eu não dê a entender que eu esteja pregando a justificação através de uma denominação e não somente pela fé, ou o acesso e mediação com Deus pelo luteranismo, coisa que não acredito e o autor, pelo que pude conferir, também não. Por isso, para evitar uma leitura descontextualizada destas declarações, resolvi modificar.
Segue o texto:
LUTERANISMO TEM QUE SER UMA *NECESSIDADE* E NÃO ALGO DESEJADO APENAS INTELECTUALMENTE
O que quero dizer acima é o seguinte. Quando eu era um calvinista, eu era um calvinista principalmente porque eu estava em uma busca filosófica para “encontrar a verdade suprema.” Calvinismo era, e ainda é, um sistema que parece responder perguntas, e que é logicamente coerente.
Eu também fui muito bem sucedido em convencer muitos dos meus amigos que eles também tinham que abraçar o Calvinismo.
Mas este mesmo sistema, que é logicamente rigoroso, também é orientado quase que totalmente para a Lei. Tem que ser. Queremos algo que faz sentido, e a Lei faz sentido para nós. É uma teologia da Glória, e este é o tipo de teologia que nós amamos como pecadores caídos.
Mas, depois de um tempo, a Lei faz o seu trabalho de matar. Chegamos ao ponto do desespero tomar conta de nós por causa de nós mesmos. Alguma coisa pode acontecer na sua vida que não faz sentido e até mesmo o sistema do calvinismo, que tenta explicar tudo, não consegue tirar o sofrimento.
Então aprendemos silogismos oportunos e fórmulas lógicas, mas nada desses argumentos lógicos são realmente sobre o que a vida é.
Chegamos a perceber que “encontrar a verdade” não é o que dá sentido à vida.
Tornamo-nos convencidos de que sabemos que somos culpados e nós queremos garantir que temos um Deus gracioso.
Torna-se menos sobre encontrar a verdade e mais sobre conforto, e segurança, e cuidado pastoral.
Todos nós temos essa necessidade básica do perdão dos pecados.
AS PESSOAS NÃO SE TORNAM “CONVENCIDAS INTELECTUALMENTE” DO LUTERANISMO
Quando eu era um calvinista, eu “convenci intelectualmente” a vários amigos sobre a teologia da Glória que é o Calvinismo. Mas desde que eu me tornei um luterano, você sabe quantas pessoas eu convenci?
Zero.
Minha esposa recentemente se tornou Luterana, mas não foi por minha causa. Foi através de estar mergulhada no Serviço Divino (N.T. Liturgia). Então ela viu que isso (N.T. Luteranismo) era o que ela *precisava*. Só que agora ela percebe que o Calvinismo não poderia oferecer-lhe segurança. Ela percebeu que o luteranismo é aonde Cristo vem até ela. (N.T. Cremos na presença real e corpórea de Jesus na Santa Ceia, coisa que o Calvinismo não crê)
Da mesma forma, o luteranismo é incompreendido. É estranho para a maioria. Mergulhando na Divina Liturgia, minha esposa tornou-se familiarizada com a beleza de Deus em Cristo nos trazendo Seus Bons presentes a nós que pedimos.
Eu também costumava argumentar a partir da história da Igreja e da catolicidade do luteranismo. Mesmo que tudo isso seja verdade, a maioria das pessoas não pensa dessa maneira. Afinal, se olharmos apenas para catolicidade, que dizer de alguém que está flertando com a Ortodoxia Oriental? Ortodoxia Oriental tem catolicidade no seu lado também. Assim, enquanto catolicidade é importante, não deve ser o fator decisivo.
As pessoas não costumam, não devem, ou mesmo não podem se tornar “intelectualmente convencidas” do luteranismo.
Luteranismo não é uma religião do “conservadorismo americano” (N.T. Ol’ time Murican religion)
Luteranismo tem de ser uma *necessidade*.
O LUTERANISMO OFERECE A SEGURANÇA DE QUE TEMOS UM DEUS DA GRAÇA
Eu percebo que o título em negrito acima pode parecer simplista para alguns, e até injusto para outros. Mas eu não seria um Luterano a não ser que eu realmente acreditasse nisso. Eu não recebo o suficiente do Evangelho em Roma, que faz muitas exigências sobre esforços e méritos. Eu não entendo o suficiente do Evangelho na Ortodoxia Oriental, que se concentra em nosso caminho para theosis. Eu não recebo o suficiente do Evangelho no evangelicalismo, que está sempre perguntando se estamos servindo a Deus o suficiente. Eu não recebo o suficiente do Evangelho no calvinismo, que não pode ficar longe de ser orientado para a Lei e centrado na Soberania.
Eu preciso da fé que é clara e que *simplesmente me dê Jesus*, na Palavra e nos Sacramentos .
Eu *preciso* do luteranismo.
A JUSTIFICAÇÃO DEVE PERMANECER CENTRAL, E O LUTERANISMO NOS DÁ ISTO
No final do dia, todos os outros ramos da fé, ou focam na santificação, ou acabam ficando longe de outra forma do fundamento que é justificação. Apenas o luteranismo mantém a justificação como central, em todos os momentos, porque o luteranismo vê justificação como uma contínua *declaração* do nosso Deus gracioso de que nossos pecados são perdoados. Ele se inclina para o nosso nível, sabendo que nem sempre nos sentimos *perdoados*. Então, Deus nos dá suas promessas graciosas na Palavra e nos Sacramentos. A graça de Deus é objetiva e universal. Ele não depende de nossa fé.
O LUTERANISMO É REALMENTE UM “CAMINHO SOLITÁRIO”
Luteranismo tem sido chamado de “o caminho solitário” por Herman Sasse. E isso é verdade. É um caminho solitário, porque é a teologia da cruz. A teologia da glória está em toda parte. A teologia da glória faz sentido para nós, e satisfaz o nosso intelecto.
Luteranismo, por outro lado, não faz sentido. É paradoxal. Ele vai completamente contra os nossos sentimentos.
Nós nem sempre nos “sentimos” perdoados.
Luteranismo diz “você está perdoado, e aqui está o Corpo e Sangue de Cristo para provar isso.”
Luteranismo diz “você está perdoado, e aqui está um ministro que declara a Palavra de Deus para você e coloca suas mãos sobre você para provar isso.”
Luteranismo diz “você está perdoado, e esta água e a Palavra de Deus lavam os seus pecados para provar isso.”
Luteranismo diz “você está perdoado, e nós vamos fazer uma procissão no corredor com o livro dos Evangelhos para provar isso.” (N.T. Em muitas Igrejas Luteranas há uma pequena procissão na entrada do pastor, com algum assistente segurando a Bíblia na frente dele, junto com um crucifixo, para simbolizar que o Evangelho será anunciado no culto)
Luteranismo diz: “FOI POR *VOCÊ *.”
Não em categorias gerais.
*Você*.
Então, por que o luteranismo?
Porque eu preciso *disso*.
Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém.
Créditos: Josh Brisby (Clique no nome do autor para ir ao blog dele – em inglês)
Este paradoxo da “justificação completa pela graça somente”, ou Teologia da Cruz, é para mim o maior argumento contra a acusação de ateus e agnósticos de que a Bíblia é uma invenção humana de algumas dúzias de autores da antiguidade. Ninguém é capaz de inventar este paradoxo racionalmente. Mesmo se alguns filósofos loucos se juntassem, eles jamais iriam propor a “loucura do Evangelho”, porque só esta é poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê. Como o Josh Brisby disse, é impossível “convencer” alguém de que este paradoxo pode transformar vidas e dar consolo, porque nossa mente racional pensa que esta ideia nunca funcionaria. Se não fosse pelo Espírito Santo, eu também não poderia aceitar o Evangelho como verdade.
CurtirCurtido por 1 pessoa
Thiago, graça e paz!
Sou da Assembleia de Deus, mas gosto mto da igreja luterana(frequentei a IECLB por um tempo, e pelo que pesquisei a IELB é , ainda mais,minha “cara”). Apesar de ser da AD, minha teologia é totalmente híbrida. Sou calvinista na soterologia e no sacramento do batismo, luterano na eucaristia e liturgia, e sabe se lá oq em mtos assuntos.
O que eu gostaria de expressar é minha crença sobre o “sola fide”.
Eu acho que a teologia luterana não o exprime totalmente, ao afirmar a possibilidade da perda da salvação e,como exemplo, duvidar da salvação de um cristão suicida. Não me interprete mal…vendo umas postagens antigas, axei q fui ironico com vc neste assunto, e peço desculpas…
CurtirCurtir
Oi Giovani. Que legal o seu interesse nestes temas teológicos. O cristianismo tem essa diversidade de interpretações, mas naquilo que Deus estipulou como fé salvadora somos o mesmo povo resgatado por Seu sangue.
Sobre os dois pontos, a questão da possibilidade da perda de salvação não é vista como os evangélicos sinergistas, a saber, arminianos ou semi-pelagianos, como se a fé fosse uma atitude humana de colaboração com Deus e não um dom de Deus. Apenas afirmamos que existe a apostasia e que ela é responsabilidade humana, pois Deus não quer que ninguém se perca, porém admitimos que se a salvação é somente pela fé e a pessoa creu por um tempo, mas depois deixou de crer, ela foi salva enquanto creu. As dúvidas na caminhada cristã são normais, a fé da pessoa pode até esfriar e ser reaquecida novamente, mas se ela blasfema contra o Espírito Santo ao negar a fé consciente e voluntariamente depois de ter vivido na fé, não há mais o que fazer sobre a pessoa, como as Escrituras nos ensinam. A Bíblia fala da apostasia e da perda de posição diante de Deus, então não negamos que isso ocorra.
Sobre a salvação do suicida. Aqui no blog tenho um artigo que eu traduzi da comissão Luterana de assuntos sobre a vida do Sínodo de Missouri. A salvação é somente por meio da fé. Se o suicida tinha fé, mas foi levado por causas que ele não tinha control a acabar com a própria vida, sem consciência real do que estava fazendo, ele foi salvo. Se ele não tinha fé, não foi salvo. O suicida que voluntariamente acaba com a própria vida não tem fé, mas está cometendo um ato de blasfêmia contra o Espírito Santo por sua incredulidade em tirar a própria vida, por isso será condenado.
Se estes pontos não podem ser considerados como o que Lutero chamava de “Sola Fide” da maneira que te agrada, acredito que talvez eu não entenda o que você quer dizer com “Sola Fide” e o porquê da sua frustração com Lutero sobre isso..
Grande abraço.
CurtirCurtir
Cara eu estou numa situação bem dificil mas parecida com esse texto, só não sei se terá o mesmo fim.
Nasci e cresci no contexto Não-Denominacional Carismático, eu só não chamo de neopentecostal porque a teologia da prosperidade não era necessariamente a principal influencias dessas comunidades apesar de o ser hoje. Por outro lado a Família do meu pai é Presbiteriana por tradição, e comecei a estudar o calvinismo por influencia de uns amigos, mas também comecei a estudar a História da Igreja, Patristica. Hoje frenquento uma igreja nao-denominacional, com um pegada cada vez mais proxima das Igreja Batistas tradicionais, mas no meu coração eu estou bem proximo de ser um Luterano (me irrito agora quando ouço na Santa Ceia “esse é o simbolo”), beirando o Catolicismo (me atraio mais pelo Oriental do que pelo Romano), mas não consigo abandonar a comunidade não-denominacional que faço parte.
Minha mente está bem confusa em relação a essas coisas. O que mais me incomoda na Reforma, é a total falta de consenso sobre o que é a Igreja Reformada, o que me faz pensar que esse cáos não-denominacional e sectário que cresci, apesar de não ter sido planejado por Lutero, é necessariamente um fruto da Reforma. Estava pensando em visitar alguma Igreja Luterana.
CurtirCurtir
Estou na mesma…
CurtirCurtir
Também estou nessa. Tenho impressão que o protestantismo é o pai de todas as heresias e que é impossível ser um protestante conhecendo a história da Igreja e vendo hoje que o protestantismo se tornou semelhante a Babel. Mas para mim também é muito difícil ser católico romano por causa de alguns dogmas – dos quais um católico romano não pode, em hipótese alguma, discordar. Além disso, não vejo a ortodoxia oriental como uma opção. Difícil.
CurtirCurtir
Bom dia meu irmao,estou muito feliz em ler seu post,pois frequento uma igreja ortodoxa,ja frequentei uma catolica,fui recebido numa igreja luterana(IELB)po motivo de mim mesmo,me afastei,mas quando iria a missa ou divina liturgia na igreja romana ou ortodoxa,e ouço que aquilo é um sacrifio,fico meio perdido ,pois jesus morreu uma vez so pra nos libertar dos pecados(como esta em hebreus)em nao ter que fazer um sacrifio incruento todo dia,valeu pelo artigo
CurtirCurtir
Boa tarde. Parabéns pelo artigo e pelas postagens em geral. Gostaria que me informasse alguns endereços de bons sites luteranos, sobretudo que tratam da doutrina, ou ainda de outros blogueiros que porventura escrevem sobre, exceto os sites oficiais, facilmente localizáveis na internet, como a IECLB e a IELB, os quais já tenho visitado/explorado.
CurtirCurtir